POR QUE O REINO DE DEUS É TÃO IMPORTANTE?
A teologia do Reino desempenha um papel único e crucial no legado histórico da Vineyard. Deixe-me explicar.
Um conjunto único de fatores se juntou de forma sinérgica no começo da história do Movimento Vineyard.
John Wimber foi professor na Escola de Missões Mundiais do Seminário Teológico Fuller, especializando-se em crescimento e plantação de igrejas. Eu me lembro de visitá-lo logo após essa fase. Eu fui apresentado a um conjunto de teses sobre crescimento de igrejas que haviam sido introduzidas a ele. Ele sabia perfeitamente o que funcionava e o que não funcionava na plantação de igrejas. Ele trabalhava como consultor de crescimento de igrejas já há vários anos. Esse é o fundamento sobre o qual repousa o conhecimento prático sobre plantação de igrejas e missões do Movimento Vineyard.
Enquanto John estava no Fuller, o professor de Novo Testamento era George Ladd, autor de vários livros sobre o Reino de Deus – em especial, de “The Presence of the Future” (A presença do futuro). Ladd não era famoso e nem mesmo um teólogo de referência em Novo Testamento em sua época, mas ele era um estudioso com credibilidade internacional. O que o tornava diferente dos demais era que ele introduziu a redescoberta da Teologia do Reino ao mundo teológico Evangélico Conservador, onde ele era altamente respeitado. Desde o período apostólico a escatologia (destino da humanidade e o fim do mundo) foi amplamente perdida no contexto da mensagem de Jesus. Durante o século 19, os estudiosos orientais descobriram um universo de literaturas que remetiam a épocas anteriores, contemporâneas e posteriores ao período do Novo Testamento. Durante o século 20 essas descobertas levaram a uma explosão de questionamentos e debates sobre o “Jesus Histórico” e sobre o que Ele queria dizer quando se referia ao “Reino de Deus”. A essência dessa redescoberta era que a linguagem e a forma de pensar de Jesus estavam saturadas de escatologia (linguagem do fim do mundo). Ladd resumiu e articulou os resultados desse conhecimento, conquistando reconhecimento dos mais sensíveis estudiosos bíblicos do seu tempo.
O Movimento Vineyard nasceu à partir de um reavivamento chamado de Povo de Jesus (Jesus People) ou Movimento de Jesus (Jesus Movement). Uma característica desse reavivamento era os encontros de poder, normalmente com libertação de influência demoníaca, associada ao abuso de drogas. A história de Lonnie Frisbee e o fenômeno que culminou com o surgimento da Vineyard (até então, Calvary Chapel) está agora bem documentada. Tudo isso, associado aos resultados de pesquisas que John estava tendo acesso através da faculdade de missões do Fuller, sobre o papel dos sinais e maravilhas no crescimento da igreja, se tornaram o objeto do seu famoso curso MC510.
Antes de ser parte da Calvary Chapel, Wimber havia sido um pastor Quaker. Os Quakers eram chamados assim porque “tremiam”, ou “sacudiam” quando o Espírito Santo vinha sobre eles em suas reuniões. A história dos Quakers foi um ponto de partida importante através do qual John compreendeu o fenômeno do reavivamento no Movimento de Jesus.
Tudo isso se junta de forma sinérgica. Os fenômenos de poder, ou sinais e maravilhas, através do ponto de vista dos Quakers se integra à redescoberta da Teologia do Reino – uma teologia que dava suporte a esta integração, reconhecendo que Jesus ensinou e demonstrou a chegada do Reino, ou como Wimber dizia, praticou as palavras e obras do Reino. Ed Piorek, no seu excelente estudo, chamado “Estilo clássico da Vineyard” (Vineyard classic) explica como as primeiras reuniões da Vineyard sempre tinham três ingredientes. Primeiro, havia o período de louvor liderado por John – uma adoração íntima que nos levava à presença de Deus. Em seguida, John ensinava sobre o Reino – normalmente se referindo à teologia de Ladd, contida no livro “The Presence of the Future” (A presença do futuro). Finalmente, eles iniciavam o “período de ministração”, que tinha uma nítida influência dos Quakers — orando, convidando e esperando pela vinda do Espírito Santo.
Vários estudiosos usavam frases, ou slogans, para definir a mensagem do Reino e o ministério de Jesus. Muitos falavam do “já” e do “ainda não”, alguns falavam sobre “vivermos entre épocas”, mas talvez o melhor termo, e que ainda hoje é amplamente utilizado, seja que Jesus ensinou e demonstrou a “Escatologia Inaugurada”. Os poderes do mundo futuro ou do fim do mundo (o eschaton) já foram inaugurados na terra através de Jesus. O fim dos tempos começava a tomar forma enquanto a presente era ainda não havia terminado. Esta maneira de ver o que Jesus ensinou está hoje amplamente estabelecida nos meios de estudos bíblicos. De fato, ninguém pode passar por uma faculdade ou seminário de credibilidade acadêmica sem ser exposto a esse entendimento. No entanto, Jesus não apenas ensinou sobre o início da escatologia, Ele demonstrou isso. Na verdade, Ele inaugurou o Reino futuro! Embora seja possível encontrar uma percepção do que Jesus fez, e uma grande quantidade de teorias sobre o assunto nos estudos bíblicos, hoje pouquíssimos estudiosos estarão envolvidos na tentativa de inaugurar o Reino eles mesmos ou de convocar a Igreja para vivenciar isso na prática. A teoria não leva à prática. Também é verdade que enquanto o Evangelicalismo Conservador é consciente sobre a teologia da Escatologia Inaugurada, o mesmo não acontece nos círculos Pentecostais, onde há um comprometimento com as manifestações do Espírito. Os Pentecostais têm o seu próprio padrão teológico de sinais e maravilhas, e não é o mesmo padrão da Escatologia Inaugurada.
Wimber estava envolvido com algo extremamente raro, gerado por uma sinergia ímpar no início da história da Vineyard. Ele estava envolvido com a Escatologia Inaugurada. Ou, para usar outra terminologia, Wimber iniciou o modelo dos “Evangélicos Empoderados" (ou cheios de poder) e sua práxis do Reino. Até onde eu sei, existem apenas dois movimentos no mundo de hoje que adotaram a Escatologia Inaugurada como seu paradigma teológico primário. Eles são o Movimento New Wine (Vinho Novo), nascido sob influência do ministério de Wimber, e o Movimento Vineyard.
Existem outros movimentos recentes, onde alguns poucos líderes entendem isso muito bem, que irão se referir a este paradigma, mas eu ainda não encontrei outros movimentos que tenham feito deste entendimento a base de sua teologia. Se houver, eu gostaria de ser informado. Muitos agem fora do paradigma Pentecostal clássico, ou fora do cenário Restauracionista, mas isso não é a mesma coisa. Há também muitos que poderiam ser descritos como "Evangélicos empoderados", mas poucos deles adotam a práxis do Reino. Eles, em geral, se identificam com o padrão teológico Reformado (abraçando os cinco pontos do Calvinismo, a Teologia Reformada enfatiza a centralidade de Deus ao invés da centralidade do homem - é Deus quem nos escolheu, e não nós que O escolhemos; é Ele que opera em nós a graça da salvação e transformação), e, então, repudiam o Cessacionismo (a crença de que os dons espirituais morreram com os apóstolos quando a Bíblia estava concluída). Isso não significa que eles pratiquem a Escatologia Inaugurada
Uma das minhas grandes preocupações é que surja uma geração de líderes na Vineyard que não saiba de onde viemos e que a nossa herança seja perdida. Deixe-me expressar a minha preocupação da seguinte forma: nós somos, ou deveríamos ser, fortes em três coisas. Em primeiro lugar, de acordo com o legado de missões e crescimento da igreja, a Vineyard é muito pragmática. Podemos regularmente inovar nossos modelos de ministério. Não temos regras históricas de procedimento que nos amarrem. Nós podemos descartar aquilo que não funciona. Isso é ótimo! Em segundo lugar, temos uma herança de encontro com Deus, ou do ministério de poder do Espírito Santo. Podemos ser descritos como bastante místicos em nossa adoração. Somos orientados para a experiência com Deus, e somos guiados por essa busca. Terceiro, nós temos um legado da Teologia do Reino, a qual eu descrevi como, Escatologia Inaugurada. Se olharmos historicamente para o Movimento Metodista, pelo qual Wimber tinha um grande respeito, podemos ver uma grande semelhança com a Vineyard: um excelente pragmatismo (eles não foram chamados de "metodistas" à toa) e uma história de reavivamento e experiências de "bênçãos" - como eles as chamavam. No entanto, os Metodistas nunca foram fortes na doutrina, ou em seus fundamentos teológicos (como, por exemplo, as igrejas Reformadas são). Infelizmente, quando veio o liberalismo teológico, ele teve um efeito mais devastador sobre o Metodismo do que sobre outros movimentos. Temo que se separarmos nosso pragmatismo e orientação experiencial da nossa herança teológica, podemos nos tornar um movimento muito liberal no transcurso de apenas uma geração.
Em outras palavras, a maioria dos que estão na Vineyard hoje tem algum histórico no Evangelicalismo Conservador ou no Pentecostalismo. Ambas as tradições têm dado uma contribuição rica e maravilhosa para a Igreja e vão continuar a fazê-lo. No entanto, a Vineyard não pertence nem a uma corrente, nem à outra. Se perdermos nossas raízes teológicas, e deixarmos a Escatologia Inaugurada para trás, certamente vamos cair em um dos dois modelos –Evangelicalismo Conservador ou Pentecostalismo Clássico. Se isso ocorrer, vamos deixar de oferecer para a Igreja o nosso sabor singular. Isso seria trágico.
Derek Morphew é um dos mais respeitados e conhecidos teólogos da Vineyard. Ele publicou dois livros: “South Africa: the power behind” e “Breakthrough: Discovering the Kingdom”. Ele é o pastor-fundador da Comunidade Cristã Vineyard em Kenilworth, Cidade do Cabo, na África do Sul, serve na equipe de liderança nacional da Associação das Igrejas Vineyard da África do Sul e é o Deão do Vineyard Institute.
Fonte: http://www.vineyardchurches.org.uk
Tradução: Maurício Boehme